Pela primeira vez, foi observado o ato sexual de um pequeno polvo que vive no Oceano Pacífico, o Hapalochlaena fasciata. Seu comportamento sexual, agora filmado, poderia figurar em um filme pornográfico de terror se fosse praticado por seres humanos.
Esse polvo, do tamanho de uma bola de golfe (4,5 cm em média), existe em grande quantidade nos recifes de coral e é considerado uma das três espécies animais mais perigosas para o ser humano. Basta ser beliscado pela pequena boca do animal para uma pessoa morrer.
Essa é considerada uma das três espécies mais perigosas para o ser humano
Foto: Mike Workman/Adobe Stock
Sua glândula salivar produz uma das neurotoxinas mais poderosas (tetrodotoxina). O veneno contido em uma glândula é suficiente para matar sete humanos e é usado para paralisar instantaneamente suas presas. Para nossa sorte, esse pequeno animal é tímido e logo se esconde nas frestas dos corais quando uma pessoa se aproxima. As mortes registradas ocorreram quando mergulhadores pegaram um deles com as mãos.
Mas vamos ao que interessa. Os animais foram capturados e observados em aquários pelos cientistas. As fêmeas são quatro vezes maiores que os machos, a espécie é carnívora, as fêmeas não têm pruridos e devoram os machos que se aproximam. Nessas condições, como saciar o desejo sexual e garantir a sobrevivência da espécie sem ser devorado?
O que os cientistas observaram é que o macho se aproxima por trás, abraça a fêmea com os tentáculos e parece morder seu pescoço (se é que podemos chamar de pescoço a parte do corpo que liga a cabeça aos tentáculos). Nesse momento a fêmea perde a cor e desfalece.
Então, o macho insere seu Hectocotylus (o tentáculo modificado que produz os espermatozóides e funciona como um pênis) sob o manto da fêmea. Consumado o ato, o macho solta a fêmea desfalecida e foge para um local seguro antes de a fêmea recuperar os sentidos e a cor.
Intrigados com a reação da fêmea durante o ato sexual, os cientistas as examinaram. Encontraram em seus pescoços as marcas da mordida e evidências que os machos, ao morder as fêmeas, injetam diretamente na corrente sanguínea uma pequena quantidade de veneno que provocava o desfalecimento. Elas não desmilinguiram de prazer, mas ficaram desacordadas devido à neurotoxina. O macho pratica uma versão do famoso golpe “Boa Noite Cinderela”.
Nas semanas seguintes à fecundação, a fêmea produz de 10 a 30 ovos que são incubados sob seu corpo. Nascidos os filhotes, a fêmea morre. E esse comportamento vem se repetindo por milhões de anos e garantindo a sobrevivência dessa espécie, que é abundante e não corre risco de extinção.
O ciclo reprodutivo desse animal ocorre somente uma vez durante a vida. A fêmea que preferiria usar o macho como alimento é subjugada, envenenada e inseminada uma única vez. Produz uma ninhada durante sua convalescença e, assim que cumpre seu papel de progenitora, morre.
Gosto desses exemplos de estratégias de reprodução bizarras (pelo menos aos nossos olhos), pois mostram que reproduzir é necessário para a espécie, mas os métodos selecionados durante a evolução podem ser muito diferentes dos nossos, contanto que sejam eficazes.
Entre nós, o ato sexual, além de seu papel reprodutivo, tem função no estabelecimento de uma colaboração efetiva entre os sexos na criação dos filhos. E provavelmente por esse motivo também é praticado por simples prazer. Estamos acostumados com práticas sexuais consensuais que, no mínimo, envolvem intimidade e afeto, mas não deixamos de vivenciar casos de violência, como os estupros.
Nossa estratégia reprodutiva é uma entre milhares que surgiram durante a evolução dos seres vivos, nem pior nem melhor. É o que funciona para nossa espécie. Os polvos praticam o que funciona para eles.
Mais informações: Blue-lined octopus Hapalochlaena fasciata males envenomate females to facilitate copulation. Curr. Biol 2025