Quando bolsonaristas pedem por anistia sobre a tentativa de golpe de Estado, qual a ameaça implícita? Não existe negociação por anistia sem a parte que a solicita tendo alguma carta na manga.

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Vimos isso na anistia contra os crimes cometidos pelos governos militares brasileiros. Ela era requisito para acelerar a transferência de poder para instituições democráticas. A ameaça era clara: sem anistia, os militares não largariam o poder. Se era verdade ou não, preferimos não pagar para ver.

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Essa é uma questão complexa. Quando ditadores negociam falta de responsabilização para deixar o poder, as vítimas se sentem desamparadas. Além disso, a mera possibilidade de um acordo posterior pode incentivar que golpistas e ditadores se comportem de forma mais extrema.

O ex-presidente Jair Bolsonaro no primeiro turno das eleições municipais de 2024 – Eduardo Anizelli/Folhapress

Existe uma longa lista de artigos científicos sobre condições para que impunidade retroativa gere a estabilidade esperada pelo processo.

No caso brasileiro, há até pouco tempo, nossas instituições cumpriam essas condições. Os militares deixaram a política por vários anos. Até, claro, o governo anterior trazê-los de volta, inclusive com o absurdo decreto que permitiu que membros da ativa possam ocupar cargos do Executivo por tempo indeterminado. É coincidência que 12 militares da ativa tenham sido indiciados pela PF por participação na tentativa de golpe?

Desde que saímos das mãos da ditadura que destruiu a economia brasileira, com legado de hiperinflação, desigualdade e aumento da criminalidade, o consenso mundial é por limitar ao máximo esse tipo de acordo, pois se considera que a falta de justiça para as vítimas de regimes ditatoriais e os incentivos ao maior uso de força acontecem sempre, enquanto transições eficientes são raras. É baseado nesse consenso que a Corte Internacional de Justiça ganhou força nas últimas décadas.

No caso recente brasileiro, pedido de anistia só faz sentido se há ameaça implícita de que, se não for entregue, vá haver alguma rebelião ou algo do gênero. De outra forma, qual seria o motivo para a falta de responsabilização criminal? A Justiça decide se houve delito e aplica penas correspondentes, e fim de papo.

Anistia no qual só um lado se beneficia e não entrega nada não faz nenhum sentido lógico. Os militares entregaram a economia destruída, mas saíram da vida pública na década de 1980. Esse era o acordo.

Hoje, pensar em anistia para as tentativas golpistas é só atropelar a Justiça. De novo, a não ser que haja uma ameaça. Se houver, que se coloque na mesa. O pedido de anistia é porque ex-membros do governo planejam novo ataque às instituições? Vão conclamar os militares a dar um golpe? Se não houver, o pedido correto é de clemência, que deveria ser negada sumariamente.

O pior dessa história é ver o caráter de cada governante. Goste-se ou não de Lula, ele nunca se negou a colocar o dele na reta. Foi preso na década de 1980 e aguentou, de novo, a prisão na década passada. Enquanto isso, o valente ex-capitão já se refugiou em embaixada e faz tudo para não ser responsabilizado por suas atitudes. Isso porque só é valente da boca para fora.

Anistia? Não faz nenhum sentido. Clemência para quem se comporta de forma covarde? Nem pensar. Trama golpista se decide na Justiça. E ponto final.

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