Há sete anos, o advogado Luiz Gustavo Neves, 44, fundou, com outros três amigos, a GigU, empresa que se propõe a ser o universo dos gigs, como são chamados os trabalhadores de aplicativos. Por enquanto, a startup brasileira se prolifera por Brasil, EUA, Portugal e México, permitindo que motoristas e entregadores escolham, dentre as diversas plataformas, a que paga mais por uma corrida. O serviço levou a Uber a processá-los. O caso foi parar no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que agora avalia o suposto abuso de poder econômico do gigante do transportes.
Consultada, a Uber informa que existe um código da comunidade [de motoristas] e que o uso de robôs ou sistemas de automação durante o uso do aplicativo violam essas condições. “Apenas como exemplo, enquanto utilizava um robô instalado no celular, um motorista de Aracaju foi responsável por recusar mais de 1.100 pedidos de viagem em um único dia. Com isso, potencialmente mais de mil usuários tiveram uma experiência pior, tendo de esperar mais para um motorista aceitar e iniciar sua viagem,” disse a empresa, em nota.
Por que a GigU prejudica tanto a Uber?
Porque, para a Uber, o interessante é que os motoristas aceitem toda e qualquer corrida. Só que, nos últimos anos, a inflação sobre peças, combustível, automóveis fez com que os motoristas entendessem que não poderiam mais aceitar qualquer uma, porque não estavam mais ganhando dinheiro. O nosso aplicativo faz esse cálculo. Em tempo real, aponta a corrida mais vantajosa em relação a todas as plataformas ativas naquele momento, mostrando o valor pago por quilômetro antes de ele aceitar.
Vocês são contra a Uber?
É impressionante a penetração e dominância dela no mercado, mas a gente não fez isso [o GigU] para ameaçar a vantagem dela e, sim, para melhorar a vida do motorista. Não espero que a Uber comece a dar transparência. O que a gente espera é que nosso serviço possa ser oferecido no mercado sem represálias.
A Uber processa a GigU. Foi por isso que vocês recorreram ao Cade?
Sim, essa é uma das alternativas de defesa. Somos uma startup brasileira na fase da infância ainda. Como é que a gente briga com uma empresa de centenas de bilhões de dólares? Vimos no Cade uma saída, acusamos a Uber de abuso de poder econômico, porque ela tentou, de fato, sabotar a nossa operação.
Como assim?
Primeiro, o processo judicial é cheio de argumentos absurdos e até mentiras. A Uber diz, por exemplo, que a gente pega foto de passageiro, algo que fere a Lei Geral de Proteção de Dados. Faço uma provocação: pergunte a um motorista de Uber se, uma única vez, ele viu a foto do passageiro antes de pegá-lo. Além disso, nossa ferramenta só interage com o que aparece na tela do celular do motorista.
Hoje, revertemos a decisão judicial que suspendeu nosso aplicativo. Mas, naquele momento da decisão inicial, a Uber enviou e-mails para, praticamente, toda a base de motoristas com uma mensagem enigmática, sem citar nosso nome, de que se usassem a ferramenta poderiam ser banidos. Quis causar pânico.
Esse serviço vale para entregadores também?
Sim, estamos testando uma versão beta do iFood nesse momento.
Quantos são os usuários da GigU, afinal?
Lançamos o aplicativo há quatro meses, de forma gratuita. Inicialmente, foram 250 mil downloads. Já estamos com 500 mil e, agora, passamos a cobrar uma assinatura para ajudar a nos financiar [nessa briga]. São R$ 12,90 por mês. Já conseguimos atingir nosso breakeven [equilíbrio entre ganhos e despesas].
Em quatro meses?
Com dois meses apenas de mensalidade, conseguimos o equilíbrio.
Há investidores por trás?
Sim. Fechamos uma rodada no fim do ano passado com Redpoint, eVentures, Raio Capital ACE Ventures, Nestal e o Banco Arbi. Levantamos US$ 1,2 milhão para a expansão nos EUA, Portugal e México.
Isso pode massificar sua plataforma?
Ajuda muito. O mercado lá é o dobro do nosso. Aqui são cerca de 2,2 milhões de motoristas. Nos EUA, eles são cerca de 4,5 milhões. Já estamos operando em Portugal e devemos chegar ao México em dois meses.
Como remuneram os investidores?
Temos outros planos do que podemos oferecer para os motoristas. Nosso objetivo central é ser aquele lugar onde ele encontra tudo o que precisa, de produtos a serviços financeiros.
Virar um hub e ser remunerado por isso?
Exato.
Raio-X
Luiz Gustavo Neves
Advogado (PUC-RJ), trabalhou por mais de uma década com contencioso tributário antes de se tornar empreendedor. Em 2012, foi um dos idealizadores e responsáveis pelo projeto de revitalização de uma grande área do Jockey Club do Rio de Janeiro que hoje comporta restaurantes e galerias de arte.
Com Stéfanie Rigamonti