Chao Fang, University of Liverpool e Alastair Comery, University of Bath
Pela primeira vez na história da Humanidade, vivemos numa era em que chegar à velhice é algo quase garantido. Diferentemente de épocas passadas, quando viver até uma idade mais avançada era um luxo concedido principalmente aos privilegiados, globalmente cerca de 79% das mulheres e 70% dos homens podem esperar chegar aos 65 anos ou mais.
Apesar da maior expectativa de vida, muitas pessoas no Ocidente contemporâneo veem o envelhecimento como algo indesejável e mesmo assustador. Entretanto, pesquisas mostram que a ansiedade em relação ao envelhecimento pode ser, na verdade, medo do desconhecido.
O foco na juventude e na capacidade de nossa sociedade pode causar ansiedade quanto a se tornar fraco e indesejável. Os anúncios de produtos antienvelhecimento estão em toda parte, reforçando a ideia de que envelhecer é inerentemente pouco atraente.
Algumas pessoas temem tanto o envelhecimento que ele se torna uma condição patológica chamada gerascofobia, levando a pensamentos e comportamentos irracionais como, por exemplo, uma fixação na saúde, na doença e na mortalidade e uma preocupação em esconder os sinais de envelhecimento.
Ouvimos com frequência sobre tentativas de reverter o envelhecimento, geralmente feitas pelos super-ricos. Bryan Johnson, um empresário americano de 45 anos, por exemplo, está gastando milhões de dólares por ano para obter a idade física de 18 anos.
Embora o desejo de reverter o envelhecimento não seja um fenômeno novo, os avanços da biomedicina o trouxeram mais próximo da realidade.
Trabalho publicado pelo professor de genética David Sinclair da Universidade de Harvard em 2019 sugere que pode ser possível desafiar os limites da reprodução celular para estender nossa vida útil, por exemplo. Sua teoria da informação do envelhecimento argumenta que a reprogramação do DNA pode melhorar tecidos danificados e velhos e retardar – ou mesmo reverter – o envelhecimento. Entretanto, essas novas possibilidades também podem aumentar nosso medo do envelhecimento.
De improdutivo a desvalorizado
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As pessoas nem sempre temeram envelhecer. Em muitas sociedades, os idosos costumavam ser amplamente considerados sábios e importantes – e em algumas ainda são.
Na China antiga, havia uma cultura de respeito e busca de conselhos dos membros mais velhos da família. Ainda existe um ethos de piedade filial (mostrar reverência e cuidado com os mais velhos e ancestrais) hoje em dia, mesmo que não seja tão pronunciado como era antes. O mesmo acontecia na Europa medieval, onde as experiências e a sabedoria dos idosos eram muito valorizadas.
Entretanto, a Revolução Industrial no Ocidente, a partir do século 18, levou a uma mudança cultural em que os idosos foram excluídos da sociedade e considerados improdutivos. As pessoas que haviam ultrapassado a idade para trabalhar, assim como aquelas com doenças incuráveis, eram consideradas pela sociedade “males” que precisavam de assistência.
O tratamento dos idosos assumiu uma forma diferente desde o início do século XX. A introdução de sistemas universais de aposentadoria tornou o envelhecimento uma preocupação central dos sistemas de bem-estar. Porém, à medida que as demandas por assistência social e de saúde aumentaram, os jornalistas retratam cada vez mais o envelhecimento como um fardo para a sociedade.
Consequentemente, envelhecer é frequentemente associado ao gerenciamento do risco de problemas de saúde e ao alívio do ônus dos cuidados dos parentes mais jovens. Isso pode resultar na institucionalização de pessoas idosas em instalações residenciais que as mantêm escondidas, isoladas do conhecimento das gerações mais jovens.
Uma pesquisa que analisou as respostas de 1.200 adultos norte-americanos do levantamento “Images of Ageing” (“Imagens do Envelhecimento”) da American Association of Retired Persons (Associação Americana de Pessoas Aposentadas) mostra que grande parte do medo percebido do envelhecimento está intimamente ligada ao medo do desconhecido, e não ao processo de envelhecimento em si. Esse medo é exacerbado pelo fato de as gerações mais velhas e as mais jovens viverem vidas muito separadas.
A prevalência de famílias nucleares e o declínio das comunidades tradicionais de gerações mistas privaram os jovens da oportunidade de entender melhor as experiências dos idosos. Além disso, o grande e rápido aumento nos preços dos imóveis significa que muitos jovens não podem se dar ao luxo de morar perto de seus parentes mais velhos.
A separação entre os idosos e as crianças e os jovens desencadeou conflitos geracionais que parecem continuar a aumentar mais do que nunca. As pessoas mais velhas são frequentemente retratadas na mídia como conservadoras e privilegiadas, tornando difícil para as gerações mais jovens compreenderem por que as pessoas mais velhas agem e pensam da maneira que fazem.
Interação intergeracional
Os acadêmicos sugerem que é vital criar um sistema para que as gerações mais velhas e mais jovens interajam em ambientes cotidianos.
Um conjunto de três estudos feitos no Reino Unido em 2016 analisou e comparou os efeitos do contato direto, do contato estendido e das interações entre pessoas mais jovens (de 17 a 30 anos) e mais velhas (65 anos ou mais). Os resultados indicaram que o contato intergeracional direto de boa qualidade pode melhorar as atitudes dos jovens em relação aos idosos (especialmente quando mantido ao longo do tempo).
Programas intergeracionais foram adotados globalmente, incluindo moradias mistas e intergeracionais, corais comunitários e voluntários idosos lendo para crianças pequenas em creches.
Estudos mostram que essas atividades podem não apenas melhorar o bem-estar dos idosos, mas também ajudar os mais jovens a apreciar o envelhecimento como um estágio valioso e gratificante da vida.
Preocupar-se com o envelhecimento é normal, assim como sentimos ansiedade em outros estágios da vida, como na adolescência e no casamento. Mas a questão é a seguinte: em vez de ver o envelhecimento como uma algo assombroso, é importante perceber que ele é apenas uma parte da vida.
Quando entendemos que o envelhecimento é uma experiência normal, podemos deixar de lado essas preocupações e encarar a jornada pelos diferentes estágios da vida com uma atitude positiva e uma vontade fortalecida de enriquecer nossa vida e a vida das pessoas ao nosso redor.
Chao Fang, Lecturer in Sociology, Deputy Director of the Centre for Ageing and the Life Course, University of Liverpool e Alastair Comery, PhD Candidate, Sociology, Centre for Death and Society, University of Bath
This article is republished from The Conversation under a Creative Commons license. Read the original article.
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